domingo, 29 de setembro de 2013

Confie!



Vigiar, fuçar, fuxicar. Nos dias de hoje, um namoro não significa apenas estar com quem se gosta, é pouco. Um namoro é comunhão de bens: telefone, carteira, Facebook. Confiança não basta ser ser olho no olho, tem que olhar as mensagens, saber onde está. E pior: nada é com o consentimento do outro, é tudo escondido. Seria o namoro uma farsa? Para essas pessoas, digo: quem procura, acha. E se não achar, inventa. A paranóia é tanta que você começa a achar coisas, criar coisas. A relação é feliz quando está junto e desconfiada quando está longe.
Não vivi há 50 anos, mas quem está casado há 30 ou mais sabe o que é uma relação feliz. Se o outro fez, não há como saber. Está feito, e para quê descobrir?
Você conquistava alguém com uma ida ao cinema, e não com um status de relacionamento. Uma relação baseada na confiança significava uma relação duradoura. E ainda continua sendo a maior prova de amor que alguém pode dar ao seu parceiro.
Se você não confia no seu taco, dê um upgrade. Uma tacada errada pode não ter volta.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Desencontro



Ele a olhou. Ela já estava olhando. O sentimento pairou e eles se encontraram. Ele apressado, ela tímida. Ele quis namorar, ela quis ir com calma. Ela quis namorar, ele quis ir com calma. Ele gostava de poesia. Ela de crônica. Ela imaginava os dois deitados juntos, ela com a camisa dele, recitando poesia. Domingo, o sol do fim de tarde batendo na janela e fazendo sombra em meio rosto dele. Ele só queria trabalhar. Ela só queria ajudar. Ele só pensava em problema. Ela só queria solução. Ele só arrumava desculpa. Ela se cansou. Ela o quis, e ele queria um tempo. Ele queria um tempo. Ele tem o tempo, e ela foi embora.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Dia do irmão



Até hoje não sei se me arrependo por minha mãe não ter me dado um irmão. Ela se arrepende. Mesmo assim, a vida nunca me deixou sozinha: desde pequena - por dom, ou sorte ou seja-lá-o-que-você-quiser-chamar - nunca tive problemas em me dar bem com as pessoas, o que significa que hoje em dia tenho amigos para dar e vender (mas não quero dar nem vender ninguém, ok?). Alguns eu me decepcionei depois de velha, outros eu estudei até o ensino médio junto e hoje em dia mal olham para mim. Alguns foram falsos, outros simplesmente sumiram. Dessa penca de gente, uns poucos ficaram. Esses poucos sempre valeram à pena, nunca me deixaram na mão. E são esses poucos que hoje saciam a minha vontade de ter tido irmãos. Eu não sei se eles todos serão meus amigos para a vida inteira, mas hoje em dia eles tapam qualquer buraco, eles são irmãos. E, ao longo da vida, os conheci no maternal, na praia, na dança e até na faculdade. A manha nunca se perde. Espero continuar fazendo amigos-irmãos até morrer, são eles que me mantém alegre, cheia de vida e com forças para seguir quando tudo vai mal. Só espero que eles nunca me imitem senão eu conto tudo pra minha mãe.

domingo, 1 de setembro de 2013

Designer do meu interior



Foi tudo tão rápido, como o primeiro vagão do metrô que passa na estação por uma moça e a deixa com os cabelos bagunçados. Assim como o metrô, você também parou. Desceu na minha estação e bagunçou tudo aqui dentro, ó, moço. Mas não precisa nem me ajudar a arrumar, deixa bagunçado mesmo, deixa assim que está tudo em ordem. Agora está. Antes é que estava bagunçado com poeira, teias de aranha, jornais velhos, cartas não respondidas, correspondidas. Antes aqui estava com esse cheiro de porão de casa velha, rústica, podre. Ninguém queria catar os cacos que aqui estavam, muito menos eu, que morava já acostumada com isso tudo, as flores murchas e o sangue que já havia manchado o carpete. Deixa tudo aí, vamos para outro lugar. Me leva para um lugar leve, doce, puro, livre. Mesmo que leve dias e que, no começo sim, há medo de se mudar, não desiste. Me leva. Me mostra que tem vida lá fora e que aqui dentro as coisas se arrumam num estalar de dedos, é só querer, é só deixar. Até no lixo nasce flor, não é? Me carrega porque eu me entrego, moço. Só não amassa os cacos que ainda estão aqui. Eu vou varrer pra você poder entrar limpo e não se espantar tanto. A vista da janela vai ser mais bonita de agora em diante com você aqui, radiante. Foi tudo tão rápido, moço, você entrou sem pedir licença e já foi bagunçando tudo, que nem criança quando ganha um brinquedo novo. Pintou as paredes e trocou as luzes, renovou em poucos dias o que estava esburacado, feio, sujo. Tem lugar pra você se hospedar, claro, estava mesmo sem ninguém. Moço, foi tudo muito rápido, mas te canto: quem sabe um dia, por descuido ou poesia, você goste de ficar. Bonitinho.